quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Brevidades literárias

A Maria já foi ao mercadinho, já colocou o café na mesa, já assistiu a Ana Maria, já levou o cachorro pra passear, já tomou seu café sem açúcar, já varreu o quintal, já almoçou seu arroz empapado com farofa e carne moída, já deu uma cochilada de quinze minutos, já lavou o banheiro, já voltou ao mercadinho, já lanchou, já deu tchau pra vizinha que chegava, já assistiu ao telejornal, já viu a novela, já deu boa noite pra vizinha. Mas Maria, ao dormir, não conseguiu, porque ela sentia e pensava e queria.

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Cansei de falar de mim mesmo, porque eu sou um porre, e porres me deixam com dor de cabeça. Aliás, eu nem fico de porre, nem bebo, porque não gosto do gosto. Se eu sou um porre e se eu não fico de porre, eu não seria eu?

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Eu não escrevo português, eu me escrevo. Eu não escrevi isso, mas gostaria de tê-lo feito.

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Quando você termina uma coisa, até começar outra é difícil, difícil, difícil.

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O João perguntou pro Joaquim se ele um dia morreria. Ele disse que não, porque ele não morreria: “Ou viro estrela, ou viro purpurina, porque sou bicha.” Foi aí que João disse: “Que nojo, vou embora.” E foi.

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Fatalista, fatalista, fatalista. Sou fatalista, fat. Porque sou força de atrito, sou fatal. Fato.

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Estamos com calor, porque o sol está muito forte em cima de nossas cabeças. Anita chegou ao seu pai, já perguntando: “Papai, o que faremos, diante desta situação? Passeando aqui por São Cristóvão, sem uma sombrinha?” Papai respondeu: “Anita, você pode cobrir-se sozinha. Basta querer.” Mas ela disse que não queria se cobrir sozinha; queria que alguém a ajudasse a cobri-la em seu desassossego em Santo Cristo Ovo.

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Eu sinto-me ridículo divulgando-me. Parece que eu estou torturando as pessoas com a obrigação de elas prestarem atenção no que digo e escrevo. Escrevo? Sim. Sou escrito? Não. Mentirinha, apenas uma vez, mas deve ter sido por caridade, mas gostei tanto.

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Todos querem aparecer

Eu quero transparecer

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Aceitem-me ou Engulam-me

Dão-me apenas alguns dedos
Mas eu quero a oficialidade da mão toda.

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