sábado, 18 de junho de 2011

Fotojornalismo, isso?!


(ISSO É FOTOJORNALISMO)

Ficou em cartaz, na Caixa Cultura, até o último domingo (19/06), a exposição de fotojornalismo mais prestigiada do mundo. Nesta edição de 2011, o World Press Photo – organização sem fins lucrativos, fundada em 1955, com sede na Holanda – exibiu mais de 100 recortes da realidade, selecionados por um grupo de profissionais da área amplo e eclético, composto também pela brasileira Marizilda Cruppe, do jornal carioca “O Globo”. Outra presença nacional foi a menção honrosa dada ao jornal “O Dia”, por uma sequência de fotos onde se vê uma troca de tiros no subúrbio do Rio.

Mas muita coisa deve ser questionada através das escolhas das “melhores fotos de 2010”, até mesmo sob a ótica de seu caráter fotojornalistico. Como exemplo: o júri premiou uma série de imagens retiradas do Google Earth, um aplicativo via satélite do site de buscas Google que registra as vias públicas do mundo todo. Nelas se viam idosos tropeçando na rua, pessoas caindo de bicicleta e gente sendo assaltada. Ou seja, curiosos flagras. Mas fotojornalismo? Além de tudo, existe a questão da autoria, pois o autor “responsável” pelas imagens é o Google, já que o fotógrafo que levou essas imagens à seleção do WPF apenas as selecionou, jamais as tendo tirado. São fotos de má qualidade que demonstram apenas vigor de uma nova tecnologia. Portanto, pode-se pensar que o júri quis com isso que o público refletisse. Conseguiu, mas chega-se a conclusão de que fotojornalismo ainda é outra coisa que não imagens selecionadas da tela do PC.

Há também o fotógrafo que levou fotos, tiradas há anos em locais diversos do mundo, novamente a esses mesmos locais, só que atualmente. Deixando-as em posição que permitisse com que ficassem em exata sincronia com o resto da paisagem, dá a impressão de que não é uma foto em cima da paisagem, mas apenas uma, ainda que cheia de contrastes e mudanças de tempo. Gera sim uma reflexão, ainda que bem forçada e passíveis de erros: os tempos mudaram, a globalização, ditaduras vieram e foram, a natureza hoje está degradada etc. Mas esse trabalho parece um ensaio artístico pensado e frio, não um registro da história em seu latente dia-a-dia.

Outros casos demonstram que a seleção de 2011 é a pior já vista nos últimos tempos, onde raras imagens se salvam. Vários retratos, havendo um sentido apenas através de seus contextos, não existindo a força da imagem única e tocante, independente de arestas. Imagens de corpo inteiro de jovens e senhoras em feiras na Irlanda são registros do cotidiano que fazem sentido para ilustração de uma reportagem, mas como linguagem própria, candidata à eternidade, é muito pouco.

Já as várias fotos premiadas que mostram o Haiti são ambíguas. Diante da situação factual do país, de miséria e calamidade, quase qualquer foto pode tocar sentimentalmente o mundo capitalista e globalizado. No entanto, muitas delas ocorrem única e exclusivamente porque o fotógrafo estava ali. Ou seja, uma delas mostra uma senhora com uma caixa na cabeça e escombros ao fundo. Qualquer pessoa poderia fazer esse registro. O que é, no julgamento aqui presente, tocante e passível de reflexão, em contrate ao simples “registro”: a foto ganhadora do prêmio máximo do WPF de 2009, tirada na África em 01º de agosto de 2008. Uma senhora com seu bebê, ao final desta crítica. Já ano passado, uma foto com o ex-presidente dos EUA George W. Bush e esposa, junto de Barack Obama e esposa, conseguiam mostrar belamente os rumos do sonho americano.

Algumas fotos são plasticamente boas, como as do touro perfurando a garganta do toureiro na Espanha; a multidão sendo esmagada no Love Parade na Alemanha; uma menina dormindo cheia de moscas em seu rosto, durante as maiores inundações registradas no Paquistão. No entanto, há uma grande falta de registros mais sensíveis à realidade do mundo e com um nítido critério de rigor que une o jornalismo à fotografia, o fato à imagem. O fotojornalismo pode estar mudando, ou o que tem que mudar é o júri do prêmio para o ano que vem.

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