nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim
"vivo
sempre no presente. o futuro, não o conheço. o passado, já o não tenho.
pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de
nada. não tenho esperanças nem saudades. conhecendo o que tem sido a
minha vida até hoje - tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a
desejara -, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o
que não presumo, o que não quero, o que me
acontece de fora, até através da minha vontade? nem tenho nada no meu
passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. nunca fui senão
um vestígio e um simulacro de mim. o meu passado é tudo quanto não
consegui ser. nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que
se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a
história continua, mas não o texto". (fernando pessoa - livro do
desassossego)
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