“A história da imprensa no Brasil” foi lançado em 1966, por Nelson Werneck Sodré. Tendo durado cerca de 30 anos para ser concluído, o livro é alvo de resenha, para o término da disciplina, ministrada pelo professor Renzo Taddei, História da Comunicação. No estudo, uma análise será feita da página 306 até a página 449, perpassando pelas partes “Imprensa proletária” (página 306), “Imprensa política” (página 323) e “A imprensa burguesa” (página 355), pertencentes ao capítulo denominado “A grande imprensa”, assim como à “Condições gerais” (página 391) e “O controle da imprensa” (página 410), alocados no capítulo “A crise da imprensa”. Portanto, como forma de introdução aos temas debatidos tanto no livro como neste trabalho, problemáticas hão de ser discutidas, como a aparente e suposta desatualização da obra aos dias atuais, pois foi lançada na década de 60 do século passado; a consideração, por parte do autor, de que imprensa é sinônimo de jornal e revista, excluindo-se, assim, a televisão e o rádio: “Jornais e revistas – para só examinar o caso da imprensa – são submetidos a condicionamentos os mais diversos” (página 448); e o fato de que o livro foi publicado em plena ditadura militar (1964-1985), o que preocupa no que se refere a possíveis cerceamentos de opiniões e a polarizações ideológicas. Do mesmo modo, outras questões serão debatidas, para um melhor entendimento de uma das principais obras de estudo da Comunicação no Brasil.
Para início de resenha, Sodré, morto em 1999, aos 88 anos de idade, com “A história...” já em sua quarta edição, dá princípio à “Imprensa proletária” citando a criação, em 1901, da Federação dos Estudantes, no Rio de Janeiro. Poucas páginas depois, vem a criação da ABI, Associação Brasileira de Imprensa, em 07 de Abril de 1908, tal data passando a ser conhecida como o dia do jornalista. Surge à tona o caso da desorganização profissional latente no exercício do jornalismo, muito vista ainda hoje em dia, quanto mais no começo do século XX, que é contrastada ao surgimento dos sindicatos. Mais que tudo, como forma de justificar a necessidade de uma melhor organização por parte destes trabalhadores, foi o fato de a imprensa ter atingido uma etapa capitalista industrial e empresarial, ultrapassando, definitivamente, a fase majoritariamente amadora, tendo na ABI o resultado mais concreto disso. Do mesmo modo, o livro já se refere à linha tênue entre a imprensa e o governo, que por vezes é extremamente amigável e por outras nem tanto, no que diz respeito à inicial falta de credibilidade da Associação, tendo passado por sete sedes diferentes, até que Pedro Ernesto, em 1932, lhe concede sede fixa. Em nota de rodapé, de número 229, na página 309, o autor assinala caso “interessante”, em que a ABI consolida-se e enriquece de modo definitivo com o governo de Getúlio Vargas durante a ditadura do Estado Novo, na década de 1930.
Com esta parte do livro, surge a questão que tanto atormenta os jornalistas, de modo infundado por uns, ainda que por outros não: a organização, sistematização, sindicalismo. Os donos dos jornais, vistos pelo livro como predadores capitalistas interessados mais no dinheiro do que no interesse tanto público, quanto do seu jornalista empregado, veem seus subordinados como agitadores sociais, não vislumbrando com bons olhos seu ajuntamento. Trazendo a discussão para tempos mais modernos e atuais, fazendo-se um link entre o exposto no capítulo e hoje em dia, há a discussão sobre o diploma do jornalista, se deve ser obrigatório ou não. Mais do que saber se é preciso ou não uma formação mais específica em Comunicação para o exercício da profissão, o tema foi posto em questão para demonstrar que, mais que tudo, o jornalista associa leis, regras, organizações socialmente bem estruturadas e organizadas a um possível cerceamento da liberdade tanto de informação e de informar, quanto à do próprio jornalista. Outro fato atual que vem agregar valor à tese da dialética entre organização jornalística e liberdade é a 1ª Conferência Nacional de Comunicação, realizada em Dezembro de 2009, em Brasília. Tanto o jornal “O Globo”, em editorial do dia 18 de Dezembro, assim como a revista “Veja”, em sua edição de 23 de Dezembro, condenaram as “decisões” da Conferência, afirmando que é um ato governamental que pretende cercear a liberdade de imprensa e que se seguido levará a uma imprensa estática e oficial, como ocorre, segundo a direitista “Veja”, em Cuba, com os Castro. Mais adiante, em “O controle da imprensa”, Sodré expõe problemática semelhante, relatando a atitude do governo em denunciar a imprensa no que se refere às suas conexões e interesses internacionais.
O livro, infelizmente, por vezes faz confundir a organização sindical dos jornalistas em si com o noticiário das greves e sindicatos civis espalhados principalmente por Rio de Janeiro e São Paulo. Descreve mais o último do que o primeiro, demonstrando o receio da imprensa em relação às ideias marxistas, dentre outras semelhantes do gênero, e o surgimento de periódicos destinados à causa sindical proletária, existente muito também em consequência dos imigrantes europeus. Vê-se que esses jornais menores são duramente reprimidos e não duram muito tempo. Exemplos, segundo o autor, destes, são “A Esquerda”, “O Jovem Proletário”, “Movimento Comunista”, dentre outros. É neste capítulo que, por fim, se percebe que o livro é, por muitas vezes, apenas um aglomerado de nomes e datas, ao invés de se mostrar mais crítico. No entanto, mais ao seu fim, percebe-se uma maior crítica, em detrimento da grande enumeração de nomes, fatos e da-tas. Ponderando, justamente, há que ser pensado, também, que o livro foi lançado em 1966, dois anos após o Golpe Militar, em que a liberdade de expressão era diminuta, principalmente no que dizia respeito ao proletariado sindical comunista.
Em “Imprensa política” o autor dá bastante ênfase ao jornalismo no que diz respeito a sua evolução como produto de linguagem e de comércio, onde há a consolidação do lead e do, segundo Sodré, sublead genuinamente brasileiro. Há, interessantemente, quebrando-se, para o leitor, a chatice de se ler seguida e mecanicamente pontualidades, o relato de “causos” jornalísticos da época, sendo protagonistas, dentre eles, Lima Barreto, João do Rio e Monteiro Lobato. Conexão forte faz o livro com a literatura, mostrando que os jornais davam muita ênfase ao produto literário e que davam espaço para o lançamento de contos, poesia e, mais que tudo, livros, sendo distribuídos em capítulos durante as edições do periódico. Como percebe-se, o autor faz, indiretamente, um bom estudo sobre o movimento pré-modernista brasileiro, alavancada por Barreto e Lobato. No entanto, como o título remete, onde se encontra o “político” desse jornalismo? O autor dá bastante ênfase a, como já citado, consolidação do lead, aos avanços e inovações jornalísticas, como, “em 1893, a primeira seção feminina da imprensa brasileira, a cargo de Clotilde Doyle” e o firmamento do “Jornal do Brasil” como o grande jornal brasileiro, em situação semelhante com “O Estado de São Paulo” e o aparecimento do nome Assis Chateaubriand.
Em “A imprensa burguesa” tem-se a definitiva noção de que não há mais espaço para jornais de pequeno e médio porte, que se destinam a pequenas parcelas da popula-ção e que refletem atitude “rebelde”, dando o autor exemplos disso. “Os jornais e revistas de vida efêmera são muito mais raros agora;” (página 371). No capítulo, também, há grandes citações do “JB” e do “Estadão”, como são mais conhecidos os últimos periódicos citados anteriormente, no último parágrafo. Atualmente, eles não são mais o que eram, sendo o “JB” mais falido do que o “Estadão”. Tendo o primeiro mudado de formato, colorido seu logotipo e amargado total perda de influência política e social, o último ainda se encontra, a duras penas, entre os mais vendidos, ainda que esteja, assim como a maioria dos “grandes jornais”, perdendo espaço para os jornais populares, como já debatido durante aulas de História da Comunicação. Ainda que demore, o autor cita o jornal “O Globo”, esmiuçando a trajetória de Irineu Marinho com o jornal “A Noite”, sua venda e o lançamento, em 25 de Julho de 1925, do periódico que até hoje existe, que dá nome a rádio da Organização, assim como à rede de televisão. Indiretamente, de certa forma, vê-se que o jornal “O Dia”, ainda hoje também em circulação, é fruto dos Mari-nho, haja visto que ele foi da mesma origem do jornal “A Noite”.
Ao referir-se, no parágrafo anterior, à televisão, vem à questão o fato de que o autor não coloca na mesa de debates da história da imprensa brasileira, quase em nenhum momento, a televisão. Quando o livro foi lançado, a televisão, no Brasil, já se fazia presente há 16 anos e durante todo o fim do século XX e início do XXI foi um dos principais, senão o principal, meio de comunicação de massa. Com isso, crê-se, mais que uma displicência autoral e defasagem em relação aos tempos atuais, houve um problema oriundo da geração do Sodré. Realmente, naquela época, o maior importante e o que se considerava “imprensa séria” eram os impressos, até atualmente tal situação per-maneça de certa forma a mesma. O autor apenas se refere à televisão no caso do surgimento da “TV Globo”, em 1965, pondo em questão o problema de sua criação, com acordos complexos entre Roberto Marinho e o grupo “Time-Life”, dos Estados Unidos. Mas por mais que se compreende essa questão, o autor poderia dar algum enfoque à “TV Tupi” e outras, que perpassaram as décadas de 1950 e 60, importantes para o de-senvolvimento da Comunicação no Brasil.
Chegando-se ao fim do livro, em “A crise da imprensa”, grande espaço é dado para o debate da disponibilidade e custo do papel para a imprensa nacional e também a crise originária no governo no que se refere à camada publicitária “financiadora” dos periódicos. Naturalmente, mais a primeira que a segunda, é de se espantar que essas questões sejam vistas hoje em dia como problemas merecedores de atenção. Hoje em dia, a problemática é bem outra. Interessante e extremamente relevante saber da situação à época, mas para o leitor atual, soa completamente defasado tal discurso. Sendo as-sim, seria mais interessante e auspicioso o autor ter dado um título menos definitivo ao livro, podendo ser ele algo como “A história em tal fase da imprensa brasileira”. Hoje, a crise vem da disputa dos periódicos e revistas com a televisão e outras mídias, principal-mente internet e a publicidade é vista com muito bons olhos, sendo o periódico e revista encarado como bom e isento na quantidade e diversidade de publicidade, mostrando-se, com isso, que não possui “rabo preso”. Como exemplo, há a revista “Veja”, que não é favorável à política do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), mas que possui, em seu interior, muita publicidade estatal.
Outro problema agravador da crise, esse muito importante e completamente relevante, é a Ditadura Militar, explorada não grandemente, mas na medida certa, sendo cri-ticada e bem analisada, para as limitações da época, tanto no que se refere à repressão, quanto à proximidade dos fatos, ressaltando a tese de que a História só é contada depois que os fatos acontecem e não simultaneamente. O autor cita de modo mais veemente e espaçado a Ditadura do Estado Novo e outros momentos de repressão, expondo seu ca-ráter contrário à repressão, que em sua biografia pessoal é bem explícito, já tendo sido preso e cassado.
Com isso, diante de todo o exposto anteriormente, ainda que tenha sido uma resenha reservada a uma parte da obra, entende-se que ela é de fundamental importância para o entendimento da imprensa brasileira em desenvolvimento durante o século XX, que desemboca na imprensa que se tem na atualidade.