O melhor de tudo é sonhar, pois ou o sonho é a realização do desejo ou a repetição da cena traumática: entre meu passado e meu futuro, entre meu aprisionamento no passado e minha liberdade no futuro, entre minha possibilidade real de progredir e minha incapacidade real de alcançar.
Hoje,
quarta, eu sonhei que estava com minha mãe, meu pai e meu irmão e
avistava a frente de uma casa branca, em estilo antigo, de dois andares, com um muro
pequeno e um portão de ferro. Eu entrava com eles porque eu tinha que
achar a minha nova casa para morar, sozinho. Mas, no caso, a casa tinha
uma aura de abandonada. Aí a gente vai entrando, sem permissão de
ninguém (como se estivéssemos entrando na casa por acaso) e aos poucos,
com calma e medo, como se para não chamar atenção de ninguém (pois
estávamos ali sem autorização) entramos e primeiro vem uma cozinha que
eu acho bonita, porque solar. Eu, depois, olho como se fosse para uma
sala e descubro lá dentro um homem velho, de bermuda verde (será?) e sem
camisa: barba e cabelo grisalhos. Ele fala algo para mim, meio como
pedindo desculpas por estar ali, como se fosse um mendigo ocupando uma
casa abandonada (não dá para entender exatamente isso: acho que no sonho
ele só abre a boca, mas na minha cabeça é essa a resposta). Aí, depois,
quando eu saio da casa, no jardim vem 3 meninas e 1 menino para brincar
na casa. Eu digo que eles não podem brincar naquela hora porque a gente
estava ali para ver a casa em que eu iria morar. Eles se sentem tristes
porque queriam brincar ali, enquanto eu os estava impedindo. Eles,
enfim, contrariados, saem. Mas, logo em seguida, eu saio novamente da
casa e me dou conta de que no jardim está cheio de gente sentada em
mesas e cadeiras brancas de ferro, em festa, fazendo uma grande festa no
jardim da casa em que eu estava tentando ver para mim. Era muita gente e eu,
perplexo, passo ao redor da casa para ver todo mundo e eram pessoas que
fizeram parte da minha infância, que moraram na vila em que eu nasci e
vivi até os seis anos. Eram umas três famílias diferentes, cada uma
fechada em um núcleo da festa. Dentre essas famílias, tinha a da
Aline e o pessoal da Dona Zefina, que por causa da Tia Lucinha são meus
meio-parentes. Eles correndo, brincando, fazendo uma algazarra, e eu os
reconhecendo e querendo falar para cada um deles que eles não podiam
estar ali porque estavam atrapalhando. Era um incômodo mais porque eu e
minha família estávamos na casa meio que sem permissão para ver, meio
porque estávamos lá com uma missão séria e específica de ver algo
prático para uma vida e aquelas pessoas em festa que fizeram parte
principalmente da minha infância - e que até hoje ainda
existem de certa forma -, ali para me atrapalhar. Há uma piscina grande
atrás da casa em que a Aretha (filha da Tia Lucinha e minha primeira
namoradinha platônica, que casou-se recentemente) mergulha e eu digo para ela que
era para avisar a família dela sair de lá. Mais atrás da casa, como
se debaixo de um toldo, havia meio que uma família independente
comemorando um aniversário de algum de seus membros. Eu, chegando, meio
que incomodado por estar estragando a festa deles, mas na obrigação de
falar, digo que eles precisam sair de lá porque eu estava lá para ver a
casa e tentar morar. Eram pessoas que eu não conheço e elas todas
olham bem para mim e dizem que estão ali e não tem problema. Eu meio que
gesticulo e tento fazê-los entender que eles precisam sair da casa para
que eu possa ver a casa e que com eles ali é impossível, que assim eu
não ia conseguir ver nada e não conseguiria morar sozinho naquela casa.
Meus pais e meu irmão, depois do começo do sonho, não retornam. As
pessoas todas em festa na piscina, socializando, e eu ali rodeado pela
perturbação e dizendo que elas precisam sair de lá para que eu possa ver
e avaliar a possível primeira casa em que eu vou morar sozinho. Todas
essas pessoas que apareceram no sonho, tirando a família desconhecida,
fizeram parte da minha infância, pois conviveram comigo na vila em que
eu morei desde que eu nasci até os seis anos: ou seja, no sonho em que
eu quero achar a casa para viver sozinho surgem as pessoas que fizeram
parte da minha primeira morada, da minha primeira infância. Depois de
pedir para a família desconhecida, que comemorava algum aniversário
(eles cantavam parabéns), saísse - e eles a todo momento
contra-argumentavam - o sonho acabou. Acabou inacabado, comigo pedindo
que a festa saia para que eu possa ver melhor o lugar e com aquelas
pessoas da minha primeira infância ali festejando e com meus pais e meu
irmão ali no início do sonho me levando para ver meu novo lar, pois eram
eles que me disponibilizariam tudo.